Total de visualizações de página

sábado, 2 de fevereiro de 2008

De quem a enfermagem cuida, do cliente ou do paciente?

Profª Drª Maria Aparecida de Luca Nascimento

Muitas vezes, durante a apresentação de palestras, conferências, atividades acadêmicas, tais como; apresentação de trabalhos científicos, de dissertações de mestrado e teses de doutorado, ou até mesmo em conversas informais entre os pro- fissionais que compõem a equipe de enfermagem, ouço a seguinte pergunta quando a referência é voltada para aquele ser humano que é alvo dos nossos cuidados. Ele é paciente ou cliente?

Quase sempre, a narrativa se desenvolve utilizando o termo “paciente”, sendo logo a seguir, corrigida para o termo “cliente”, como se o termo “paciente” não soasse bem aos ouvidos da platéia.

Consideração à parte, eu confesso que sempre usei, de uma forma geral, a palavra “paciente” para me referir àquele de quem cuidava, pois, de forma específica, sempre que possível, tratava-o pelo nome, nem que para isso fosse preciso consultar o prontuário, no caso de ainda não conhecê-lo, quando da sua entrada na emergência e/ou no centro cirúrgico.

Porém, a título de uma assistência holística, na qual todos os aspectos daquele que cuidamos devem ser observados, inclusive a sua vontade e a sua cidadania, começou-se a discutir nos meios acadêmicos, se o termo “paciente” seria o mais adequado para se referir àquela pessoa que estava sendo alvo do nosso cuidado.

Dizem uns; o termo “paciente” tem uma conotação de passividade, de dependência, ao passo que o termo “cliente”, confere a ele, uma característica de independência, de autonomia.

Sendo assim, após observar esses pontos de vista, sempre que usava o termo “paciente”, comecei a me sentir culpada, mas, não convencida de que estava criando uma pseudo dependência, pois não era assim que entendia.

Porém, não conseguia explicar, nem, a minha relutância em aceitar o termo cliente, nem, a minha opção pelo termo paciente, que eu considerava um termo isento de qualquer conotação que não fosse aquela que eu pretendia dar; qual seja a de me referir à pessoa que estava sob os meus cuidados.

Bem, numa manhã, ao ouvir um programa intitulado “Mundo Corporativo”, apresentado pelo comentarista Max Gehringer, pude observar como um programa, que a princípio nada tem a ver com a enfermagem, me dava a resposta que precisava, para poder entender uma dúvida que há muito tempo me acompanhava.

O comentarista acima citado, durante a sua narrativa, como sempre, leva o ouvinte, pelo método indutivo, a perceber “pequenos” detalhes, que ao final dela, fazem grandes diferenças.

A crônica aludia ao fato de que não ter paciência poderia não ser um defeito, e não tinha nada a ver com a enfermagem, volto a repetir, pois era centrada no processo da entrevista, etapa pela qual os candidatos a um emprego se submetem para serem admitidos nas empresas.

Porém, no meio da narrativa, uma informação me chamou a atenção. Segundo ele, a palavra “paciente” deriva do vocábulo “pathos”, do qual derivou a palavra patologia, o estudo das doenças humanas, e quando o médico se refere ao “paciente”, não quer dizer que essa pessoa ficou à espera de uma consulta, pacientemente, não, quer dizer que ele é, simplesmente, um doente.

Ao consultar o dicionário da Academia Brasileira de Letras, entre outros significados, o vocábulo “paciente”, refere-se a “quem padece”, “quem suporta resignadamente”, mas também quer dizer, “doente”, simplesmente.

Por outro lado, o significado de “cliente”, entre outros, no mesmo dicionário, refere-se àquela pessoa que consulta habitualmente os profissionais de saúde, sem nenhuma alusão àquele que, de alguma forma, depende de um cuidado, mas sim de uma consulta.

Voltando ao impasse, se a referência deve ser “cliente” ou “paciente”, em que pese o fato de muitas vezes o “paciente” ter que ser “tolerante”, para esperar a sua vez de ser atendido nos serviços públicos, confesso que, determinantemente, e sem qualquer culpa, continuarei a usar o vocábulo “paciente”, para me referir àquele de quem cuido. Ademais, se considerar que Florence Nightingale referia-se a quem cuidava, por “doente” ou “enfermo”.

Contudo, pude perceber que a discussão sobre a terminologia a ser adotada parte sempre de quem vai prestar o cuidado, e não daquele que é alvo dele. Nunca ouvi uma pesquisa a respeito da opinião do paciente, não seria interessante ouvi-lo? Será que não estamos, nós, profissionais de saúde, inferindo aquilo que o paciente possa estar sentindo ao ser tratado assim?

Considerar o “paciente” um doente, não deveria ter grandes implicações pré-conceituais, pois estar doente não denigre nenhum ser humano, só o torna mais frágil, e todos nós, seres humanos, somos passíveis de desequilíbrios nas mais diferentes esferas.

A meu ver, o pequeno detalhe que faz a grande diferença durante a realização dos cuidados de enfermagem, é a possibilidade que tem o profissional de se deter na fragilidade do momento pelo qual passa o seu paciente, para que, a partir disso, possa atendê-lo, respeitando toda a sua dignidade humana.

Nenhum comentário: